quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

Mãe a tempo inteiro

Mesmo antes da Maria nascer já eu era uma mãe a tempo inteiro. Não por opção. Por necessidade. Ainda a Princesa tinha o tamanho de um feijão já eu estava em casa, com dores infinitas e aterrorizadoras. Foram semanas de angústia e medo, mesmo muito medo. Inicialmente não sabia que dores eram aquelas e por que razão me estavam a impedir de trabalhar. Achava que alguma coisa poderia estar mal com a bebé e até que os médicos (muitos !) por onde passei me tranquilizassem nada me fazia descansar. Ao que tudo indica eram dores provocadas por uma lesão muscular provocada pelo descolamento do músculo do osso, mesmo na zona das costelas. Ao que tudo indica!!!. À medida que a barriga crescia as dores também e por isso acabei por ficar a gravidez quase toda em casa, muitas vezes imobilizada e amargurada por ser uma mãe a tempo inteiro por obrigação, não por vontade.

E se nos dias que correm, onde muitos desesperam por não ter um emprego e outros sentem o mesmo mas porque têm que por um pé à frente do outro, estar em casa sem trabalho é causa de muita tristeza. Deixei de trabalhar aos 3 meses de gravidez e assim estive até a bebé nascer. Tinha planeado regressar ao trabalho 4 meses depois do parto e fazer aquilo que considero uma vida normal: trabalhar, cuidar da Maria e tudo o resto inerente à vida em família. Mas uma vez mais fui surpreendida com a realidade de ter uma filha que, mesmo sendo a melhor do mundo, tem necessidades especiais. E nestas situações começamos a redefinir as nossas prioridades e a estabelecer novos planos de vida. Por necessidade e por achar que conseguiria superar todas as dificuldades voltei ao trabalho e tudo tentei para ter a vida normal que era possível. Nessa mesma altura começaram a surgir as alterações neurológicas que temíamos e começou, inevitavelmente, o rodopio entre consultas e terapias, exames e mais exames.Foi absolutamente louco viver assim. Não que a loucura no sentido de viver 1001 coisas no mesmo dia não seja estimulante mas em muitos momentos o cansaço e a sensação de não estar a fazer tudo falaram mais alto.

Trabalhar em hotelaria  não é uma paixão, não foi aquilo que sonhei quando coloquei Turismo como primeira opção para entrada na faculdade, mas gosto. É um desafio diário mas muito cansativo. Depois de alguns meses tive que optar. Senti que estava a ser só mãe em part time quando a minha filha precisava de mim  24horas por dia, mais que uma criança sem necessidades especiais. Senti que estava a actuar como se essas necessidades não existissem, como se não merecessem mais esforço da minha parte.  E cá estou eu. Mãe a tempo inteiro, mas desta vez por opção. Se estou feliz com isto: em parte sim, em parte não. Passo a explicar. Se estivesse a trabalhar e  2 ou 3 horas diárias com a Maria e em algum momento sentisse: Se eu me tivesse dedicado mais a Princesa estaria melhor! Sentir-me ia a pior mãe do mundo. Ninguém quer ser a pior mãe do mundo. Não quis deixar nenhuma hipótese pendente, quis ter disponibilidade pelo menos para tentar. Se saber que em grande parte as melhorias da Maria se devem à minha insistência me deixa feliz, então vale a pena não estar a trabalhar. Por outro lado, esta é uma situação muito desgastante. Tal como todas as outras pessoas, também tenho sonhos, objectivos. Estudei muito para ser uma boa profissional, dediquei-me no meu trabalho fazendo o meu melhor a cada dia e hoje  cada vez que sei de colegas meus que estão nos seus trabalhos, a construir as suas carreiras, sinto-me realmente mal. Troquei os sites de turismo por explicações infinitas para os problemas da Maria, troquei os passeios de fim de semana de que tanto gostava para fazer pesquisa(ou só para conhecer) pelas idas aso hospitais e terapias quase diárias, troquei os sites sobre moda e coisas banais por blogues de outras mães de crianças especiais à procura de algum ânimo. No fundo deixei de ser aquilo que mais queria ser: uma mulher normal. Sou mãe, não sou profissional, poucas vezes sou mulher, apenas algumas serei uma boa filha e irmã. Ser mãe a tempo inteiro também tem estas coisas mais sombrias. Poucas são as saídas, poucas são as capacidades económicas, poucos são os amigos ( pois esses também desapareceram) e poucas são muitas outras coisas que agora não interessam nada. Enfim... vendo as coisas também por este lado... então não... não estou feliz com isto.

Tudo na vida tem dois lados não é.... e em tempos de crise profunda ser mãe a tempo inteiro tem custos muito elevados. A ver vamos até onde conseguirei ir.